Appy defende devolução do imposto a famílias carentes

Publicado em: 15 jul 2019

Campo Grande (MS) – O Brasil perdeu a chance de fazer uma mudança significativa no sistema tributário na Constituição de 1988. “De lá para cá, houve várias tentativas, todas fracassadas. Teve puxadinhos, ajustes. Mas a grande chance foi perdida ali”, afirma o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), durante o 4º Congresso Luso-Brasileiro de Auditores Fiscais. Appy é o mentor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 45/2019), em tramitação no Congresso Nacional, que cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e extingue cinco tributos (PIS, Pasep, Cofins, ICMS e ISS). 

Para ele, o país não tem condições de abrir mão da reforma. “Seria um custo fiscal muito alto. Estamos falando aqui, entre benefícios estaduais e federais, em muito mais de R$ 100 bilhões, apenas dos tributos que estão sendo substituídos pelo IBS”. Ele diz, ainda, que a reforma foi o dever de casa que ficou faltando no Plano Real, que completou 25 anos em 1º de julho. “O que de melhor herdamos, a partir de 1994, foi a estabilização dos preços”. Mas sobraram problemas bastante sérios no Brasil. Há uma dificuldade muito grande de ter finanças públicas sustentáveis e equilibradas, apesar da grande quantidade de regras fiscais, como meta de superavit primário, teto de gastos, regra de ouro, limite de gastos com pessoal e da própria Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Também temos o problema, extremamente importante, da baixa produtividade. Avançamos, mas muito pouco desde o Plano Real, diz Appy. Apesar dos prós e contras que a PEC 45 vem enfrentando, ele está otimista. Acha que o ambiente está mais favorável, porque União, estados, municípios e empresários querem se ver livres do custo da burocracia e da guerra fiscal que barram os investimentos e o avanço da economia. “O impacto exato (da reforma tributária) é muito difícil de calcular. Estimamos impacto sobre produtividade e poder de compra médio do brasileiro de, no mínimo, 10%, em um horizonte de 15 anos”, enfatiza. 

Em vez de desoneração da cesta básica, ele prega a devolução do imposto pago no consumo das famílias de baixa renda. É contra um projeto tributário em separado da União ou recriação do imposto sobre o cheque, anunciados pelo secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, e também não apoia a desoneração total da folha de pagamento, como querem os empresários. 

O plano Real completou 25 anos em 1º de julho. O que podemos destacar como melhor e pior?

De melhor, seguramente, é a estabilização dos preços. O Brasil avançou muito com o sistema de inflação sob controle. Temos não apenas preços estabilizados, como também o nível mais baixo de taxas de juros reais da história do Brasil, embora ainda altas para padrões internacionais. De fracasso, eu diria que o Plano Real foi macroeconômico, para estabilizar preços. Mas sobraram problemas bastante sérios ainda no Brasil. Há uma dificuldade muito grande de ter finanças públicas sustentáveis e equilibradas, apesar da grande quantidade de regras fiscais, como meta de superavit primário, teto de gastos, regra de ouro, limite de gastos com pessoal e a própria Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). E também temos o problema, extremamente importante, da baixa produtividade. 

E por quê?

Um dos principais problemas é o sistema tributário brasileiro. O desenho, na tributação de bens e serviços – mas não exclusivamente – acaba tendo um impacto muito negativo sobre a taxa de crescimento da produtividade. O atual sistema gera distorções. Faz a economia se organizar de forma extremamente ineficiente, pelo próprio custo burocrático de pagar imposto, que, no Brasil, segundo o Banco Mundial, é o mais alto do mundo. O alto grau de litígio tributário também tem alto custo, que acaba representando um peso morto para as empresas e para o Fisco. Além disso, causa enorme insegurança jurídica. O sistema tributário que onera investimentos e exportações. Temos, sobretudo, o que a gente chama de distorções alocativas. 

O que são distorções alocativas?

Quando o sistema tributário leva a economia a se organizar de forma ineficiente. Hoje, o sistema de distribuição de qualquer grande produtor de bens de consumo no Brasil é montado em cima de benefícios fiscais, aumentando o custo de logística. Ou seja, o centro  não é montado onde há caminhões rodando para fazer a mercadoria chegar ao consumidor final. É montado onde tem o melhor benefício fiscal. A guerra fiscal, do ICMS, tem um efeito muito ruim sobre a produtividade. É feita, não para explorar a vocação regional, mas para que um Estado “roube” uma empresa que, por vocação, iria para outro. O desenvolvimento sustentável no longo prazo é investir em infraestrutura, em qualificação de mão de obra, com centros de tecnologia. O atual modelo de benefícios fiscais não permite. Ao contrário. 

O senhor é autor do projeto do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que tramita no Congresso, pela Medida Provisória (MP 45/2019), apresentado pelo deputado federal Baleia Rossi (MDB/SP). Ele pode reduzir a guerra fiscal?

O IBS, na medida em que acaba com o ICMS, com regra uma transição de 10 anos, na prática, extingue esses benefícios fiscais, de forma gradativa. Obviamente, que no lugar deles a ideia é alocar recursos num fundo de desenvolvimento regional que explore as vocações regionais, qualificação de mão de obra, infraestrutura, e outros mecanismos desse tipo.

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