Conflito comercial entre China e EUA é vantajoso para MS

Publicado em: 25 jun 2018

Campo Grande (MS) – As duas maiores economias do mundo, China e Estados Unidos, estão prestes a iniciar uma guerra comercial com o potencial de abalar a atividade econômica global. Apesar do cenário preocupante, Mato Grosso do Sul pode sair favorecido. Isso porque tem a China como o maior parceiro comercial há mais de 10 anos, com pelo menos 80% dos grãos exportados destinado ao mercado asiático. 

O presidente dos EUA, Donald Trump, defende o combate aos produtos “made in China” e, desde março, iniciou sua política “America First” (América Primeiro, na tradução livre), que tem entre seus objetivos fortalecer a indústria americana em detrimento de produtos importados. 

Além disso, Trump anunciou que vai impor tarifas de 25% sobre um montante de US$ 50 bilhões de produtos chineses, acusando Pequim de “roubo de propriedade intelectual”. As sobretaxas, que devem entrar em vigor em 6 de julho, vão afetar inicialmente mais de 800 produtos. Um segundo lote de quase 300 produtos virá em seguida, e os EUA prometeram aumentar essa lista, caso a China retalie. 

Com o conflito instaurado entre chineses e estadunidenses, no mesmo momento da quebra de produção na Argentina, a produção brasileira tornou-se a primeira e praticamente única opção dos importadores, o que beneficia especialmente os produtores de Mato Grosso do Sul. 

Segundo dados da Rural Business Consultoria, de janeiro a maio, a China importou 27,7 milhões de toneladas de soja do Brasil, um aumento de 77,4% em cinco anos, na comparação com o mesmo período. O montante rendeu de lucro às empresas brasileiras cerca de US 11 bilhões, quase 34% mais do que cinco anos atrás. Em reais, o lucro chegou a R$ 37 bilhões, isto é, 124% mais em comparação há cinco anos. 

“E, tudo isso, em somente cinco meses, e apenas vendas para a China. É impressionante”, afirma Tânia Tozzi, analista de grãos da Rural Business. Segundo Tozzi, o Brasil e Mato Grosso do Sul têm tudo para “sair ganhando” com o conflito comercial da China e dos Estados Unidos. Isso, claro, se esta guerra realmente se concretizar. Somente de janeiro a maio, as exportações totais de MS para a China cresceram 24,2% e totalizaram US$ 1,1 bilhão, diante de US$ 885 milhões no mesmo período de 2017. 

“Ainda está tudo muito incerto, está no campo de ameaças de taxações entre os países. O mercado está extremamente confuso, houve uma perda gigante da bolsa de Chicago, o que assustou demais os produtores. Mas, uma coisa é certa, se taxarem essa importação dos EUA, nós teremos a soja do nosso maior concorrente valendo 25% a mais. Nós somos o único país no mundo que vai ter soja em quantidade e a preço acessível para abastecer a China”, destaca Tozzi. 

Para a especialista, outra situação que pode favorecer o Brasil é uma redução da área de plantio norte-americana, em razão do conflito internacional, o que pode deixar o Brasil ainda mais na liderança do mercado. “De todas as mudanças possíveis, são todas positivas para depois que o mercado se ajustar, após esse momento confuso. O Brasil certamente vai se tornar a bola da vez. Basta que o dólar caia, senão não vamos para lugar nenhum. E é preciso também que o governo ajuste essa tabela de frete, que está simplesmente impagável e pode trazer prejuízos grandes para o produtor em 2019”. 

Apesar das boas previsões, também é preciso cautela. “Só não vamos vender mais soja porque não temos. E isso vai gerar um grande impacto, porque pode mudar os parâmetros de comercialização da soja. Se a bola de Chicago cair muito, o mercado brasileiro vai começar a se dissociar completamente de Chicago, o que pode trazer mudanças radicais no mercado. Vai ter de ser criado um novo balizamento de preços para a soja na América do Sul”, pontua Tozzi, ressaltando que, apesar dos lucros recordes, há muita incerteza sobre o futuro do mercado, caso a guerra comercial entre China e Estados Unidos realmente se consolide. 

Carnes 

O mercado de carnes também deve sofrer os impactos do conflito internacional. Da mesma forma que acontece com a soja, deve haver uma pressão maior de compra da China no mercado brasileiro. Contudo, segundo o analista-chefe da equipe de pecuária de cortes da Rural Business, Júlio Brissac, o Brasil vive um momento de redução do volume de carne disponível para abate. “[O volume] vem diminuindo radicalmente nos últimos anos, então isso deve acarretar preços mais altos, uma vez que o que se produz hoje de carne bovina está até abaixo da necessidade da demanda externa e interna”, explica, considerando o caso da China realmente impor represálias aos norte-americanos. 

Segundo Brissac, apesar dos lucros dos produtores, que devem subir expressivamente, os frigoríficos brasileiros poderão sofrer sérias dificuldades. “A grande maioria dos frigoríficos não são exportadores. Eles serão forçados a pagar mais pelo gado no mercado interno, sem ter a variável de exportar. Serão muito mais penalizados”, alerta. 

A questão dos preços, inclusive, também vale para os grãos: com grande parte da produção sendo exportada, os preços para o mercado interno vão subir. E vale lembrar que o preço da saca de soja já está em alta histórica, valendo, em média, R$ 77,70, já é o segundo valor mais alto da série histórica de acordo com a consultoria, só perdendo para 2016, quando a saca chegou a R$ 86. “E, resolvida a questão do frete, o preço deve subir mais”, estima a analista Tânia Tozzi.

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