Campo Grande (MS) – Uma grande confusão se estabeleceu em torno da reforma administrativa. O novo relatório do deputado Arthur Maia (DEM-BA) sobre a PEC nº 32/2020, divulgado ontem, conseguiu desagradar a todos: servidores, mercado financeiro, técnicos, parlamentares de esquerda e de direita. O documento foi apelidado de “antirreforma” e de “projeto Frankenstein”. Arthur Maia trouxe de volta benefícios retirados de agentes de segurança na reforma da Previdência; acabou com a proposta de redução de jornada e de salários de servidores; manteve regras que facilitam contratações temporárias e interferência política; além de beneficiar membros de Poderes e ter pesado a mão para a base da pirâmide remuneratória do serviço público.
Com críticas de todos os lados, Arthur Maia prometeu entregar outro relatório, hoje, no final da tarde. Ao participar de uma “live” da Necton Investimentos, ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), informou que a votação da proposta ficará para o dia 21. Ontem, Lira se reuniu com o presidente da comissão, Armando Monteiro (PP-PE), e com o relator, e a avaliação foi de que ainda não há como garantir a aprovação da PEC, que precisa de, no mínimo, 308 votos no plenário, em dois turnos. “Ainda há muito ruído. Optamos por fazer a votação na terça e ela (a PEC) irá a plenário na quarta, depois de discussão com todos os partidos, porque não podemos errar no placar”, afirmou o presidente da Câmara.
Para o mercado, as mudanças previstas nas regras do funcionalismo foram tímidas. A economista Ana Carla Abrão, sócia do escritório da Consultoria Oliver Wyman do Brasil, disse que o documento “é escandalosamente ruim”. “É uma contrarreforma, definitivamente. Um retrocesso absurdo. O relator cedeu a todas as pressões corporativistas. Em particular, às da bancada da bala. No lugar de ir na direção de aumentar a eficiência, ele está trazendo para a Constituição blindagens e restrições, problemas que hoje não estão lá. Além de ter aproveitado o ensejo para incorporar retrocessos em relação à reforma da Previdência”, destacou a economista.
Ana Carla lembra que o projeto, desde o ano passado, quando foi entregue pelo governo, já começou mal, por levantar discussões que não estavam maduras, como a da estabilidade. Mas agora piorou. “Abriu-se espaço para reduzir a possibilidade de uma reforma administrativa real e necessária”, disse. “E o pior é que as chances de aprovar esse frankenstein são grandes. Afinal, ele (o relator) atendeu a muitos interesses. A situação é muito delicada”, lamentou.
O economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, lembra que a PEC enviada pelo governo federal alterava 27 trechos da Constituição e acrescentava outros 87.
A questão mais polêmica era a restrição da estabilidade dos servidores somente a carreiras típicas de Estado. Os demais a perderiam, e poderiam, inclusive, ser contratados por período definido. “Na reforma atualmente discutida, há pontos positivos e negativos. Positivo é o fato de a reforma alcançar somente os servidores que vierem a ser contratados, preservando os direitos dos atuais. Também sou favorável à redução dos salários iniciais, para torná-los mais compatíveis com os do mercado, e ao alongamento do tempo entre o início e o fim das carreiras”, assinalou Castello Branco. Por outro lado, diz ele, é preocupante a possibilidade de desligamento do serviço por “ineficiência de desempenho”, em um ambiente político tão conturbado como o dos últimos anos.
Fonte: Correio Braziliense