Campo Grande (MS) – O economista Adriano Pires já era um fiel conselheiro do governo e, recentemente, ao dizer “as coisas certas” na hora certa, recebeu a indicação para substituir o general Joaquim Silva e Luna no comando da Petrobras. Luna foi comunicado sobre sua demissão nesta segunda (28).
Assessores do Planalto afirmam que, há alguns meses, Pires defendeu publicamente a necessidade de não repassar a volatilidade do petróleo -insumo básico para a gasolina e o diesel- para o consumidor.
Este vinha sendo o principal foco de conflito entre Jair Bolsonaro (PL) e o presidente da estatal. Luna defendia a política de preços da companhia, com repasses da alta do petróleo para o consumidor, e Bolsonaro buscava retardar esses reajustes ao máximo como forma de segurar a inflação.
Pesquisa recente do Datafolha mostrou que 75% dos brasileiros consideram Bolsonaro o responsável pela alta dos preços.
Os combustíveis estão entre os itens que mais pesam no cálculo da inflação medida pelo IPCA que, nos últimos 12 meses, acumula alta de 10,54%. Já são mais de seis meses com o índice nesse patamar.
Em declarações recentes sobre os preços após o início da guerra na Ucrânia, Pires tem avaliado que o cenário excepcional demanda uma visão diferente sobre o tema.
“Não dá para dizer se o barril vai a US$ 150 ou a US$ 200. Agora, se isso acontecer, o Brasil e o mundo vão ter que apertar o botão de calamidade pública e não vão poder aumentar os preços ao consumidor. É um fenômeno mundial”, afirmou no fim de fevereiro ao site Poder 360.
Pires também propôs ao governo uma reforma da tributação de combustíveis começando pelo ICMS. Ele defendeu uma única alíquota, cobrada em reais por litro.
Esta foi a base do projeto de lei que o governo conseguiu aprovar no Congresso, mas que ainda enfrenta resistência dos estados.
Para o economista, essa alíquota deveria ser calculada com prazos mais longos do que os atuais 15 dias, como forma de amortizar os repasses de custos do petróleo das refinarias para as distribuidoras.
Para incentivar a estabilização dos preços no mercado interno, Pires avaliava a criação de um novo imposto -algo criticado pela equipe econômica-, ou um fundo específico, que foi usado em outros países e resultou em fracasso.
Doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris 13. Adriano Pires atua no mercado há mais de três décadas.
Atualmente, dirige o CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), uma consultoria especializada em regulação e estratégia do setor de energia, que presta serviços para governos e empresas.
Também integra o time de analistas do Instituto Millenium, formado por especialistas alinhados com o ideário liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Em sua consultoria, Pires tem atuado recentemente para o setor de distribuição de gás natural, como consultor da Abegás (Associação Brasileira das Distribuidoras de Gás Canalizado), setor hoje dominado pela Compass, empresa controlada pela Comgás.
É colunista do site Poder 360 e analista com presença frequente em reportagens sobre o setor de petróleo na imprensa brasileira.
Em outubro de 2021, escreveu em sua coluna que a solução para os preços dos combustíveis no Brasil é privatizar a Petrobras, em uma crítica contra a concessão de subsídios ocultos com o represamento de preços às custas das finanças da estatal.
“A solução definitiva só virá com a privatização da Petrobras. Enquanto a empresa for de economia mista, tendo o Estado como controlador, os seus benefícios corporativos e as práticas monopolistas serão mantidos -a favor da corporação e, muitas das vezes, contra os interesses do Brasil”, afirmou.
Pires atua há mais de 30 anos setor e teve participação na criação da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em um momento de abertura do mercado brasileiro de petróleo a empresas privadas.
Na época, comandada por David Zylbersztajn, a ANP defendia a venda das refinarias da Petrobras para pôr fim ao monopólio estatal no segmento, após a abertura da área de exploração e produção a petroleiras estrangeiras com os leilões de áreas petrolíferas iniciados em 2000.
Durante os governos petistas, foi um crítico do represamento de preços dos combustíveis, divulgando estimativas sobre as perdas da Petrobras ao manter os valores em períodos de alta das cotações internacionais.
Como especialista, colaborou com o governo de transição, em 2018, e, à época, seu nome foi cotado para assumir tanto o Ministério de Minas e Energia quanto a presidência da Petrobras.
Para o analista Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, trata-se de uma indicação técnica com perfil reconhecido pelo mercado como um executivo que não romperia com a estratégia adotada pela Petrobras nos últimos anos.
“O perfil de Pires também ajuda a mitigar os efeitos oriundos deste novo possível movimento [de mudanças na estratégia]”. afirmou.
Dentro da empresa, a expectativa é também de poucas mudanças, dado o perfil do nomeado. Uma fonte ligada à direção da empresa ouvida pela reportagem avaliou como um nome que “tem enorme conhecimento sobre o setor”.
Fonte: FolhaPress