Por Rodrigo Spada*
Campo Grande (MS) – Apresentada pelo Executivo como uma proposta de contenção de gastos, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 32, na verdade, terá impactos fiscais negativos. Isso acontece, segundo nota técnica do Senado Federal, porque o projeto facilita a corrupção, a captura do Estado por agentes privados e a redução da eficiência do setor público. A desestruturação proposta pela reforma administrativa atinge em cheio a missão e as prerrogativas das carreiras do Fisco na proteção do interesse público e coletivo, livres de pressões políticas e econômicas.
O fim da estabilidade dos servidores está entre as principais ameaças contidas no texto. A estabilidade visa a garantir o princípio da continuidade do serviço público, em oposição à alternância de governos. Com esse amparo legal, os servidores têm uma proteção contra pressões políticas e econômicas indevidas e podem exercer suas atribuições comprometidos com o bem do Estado e da população.
A estabilidade é especialmente vital para atividades essenciais ao funcionamento do Estado, como é o caso dos servidores diretamente dedicados à arrecadação e fiscalização tributária. Eis pois que deve ser um bem jurídico a ser protegido no escopo de qualquer reforma administrativa. Além das garantias atuais, a estabilidade é também necessária para um novo modelo de relacionamento entre Fisco e contribuintes, calcado menos em uma abordagem policialesca, e mais em reciprocidade, confiança, orientação e autorregularização.
Nesse novo marco institucional que está sendo construído, é tênue a fronteira entre a autorregularização e a impunidade, e essa indispensável separação pressupõe quadros comprometidos e perenes, razão pela qual a estabilidade se faz imprescindível. A PEC também fragiliza o serviço público ao substituir o estágio probatório pelo vínculo de experiência. O governo propõe a troca de um processo de avaliação dos servidores baseado em critérios técnicos, por outro que pode ser baseado em aspectos pessoais.
Ademais, o vínculo de experiência obriga que, necessariamente, uma parcela dos servidores seja excluída independentemente de seu bom desempenho. No caso do Fisco, o acesso a dados sigilosos no período de vínculo de experiência com a possibilidade de futura demissão implica insegurança jurídica para a sociedade e para os pagadores de impostos. A PEC 32 prevê ainda a nomeação de servidores que não passaram por concurso público para cargos de liderança e gerência de áreas técnicas e estratégicas.
Essa forma de provimento tem o potencial de criar um contingente de até 1 milhão de cargos comissionados. Com isso, há o risco de aparelhamento do Estado, deixando decisões importantes ainda mais sensíveis a interferências do poder político e econômico quando comparado aos dias atuais.
Por fim, a Carta Magna deve preservar a noção de distinção de carreiras cujas atividades são específicas ao pleno funcionamento estatal e absolutamente essenciais para a consecução dos objetivos mais amplos definidos pelo Estado nacional brasileiro. Para tanto, deve prever, no mínimo a esse elenco de carreiras essenciais já consagrado, entre outros aspectos, limite remuneratório condizente e homogêneo em todo território nacional.
*Rodrigo Spada , 43 anos, é agente fiscal de Rendas do Estado de São Paulo e presidente da Febrafite (Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais). É formado em Engenharia de Produção pela UFSCAR, em Direito pela UNESP, com MBA em Gestão Empresarial pela FIA.
Fonte: Poder 360