Navegação comercial é paralisada em Mato Grosso do Sul

Publicado em: 21 set 2021

Campo Grande (MS) – O uso da hidrovia para transporte de cargas via Rio Paraguai atingiu condição crítica. O problema, que foi registrado em outubro de 2020, neste ano chegou mais cedo. O nível negativo em Ladário já ocorre desde o dia 11, o que só foi registrado em 1º de outubro do ano passado. A tendência para o transporte de três milhões de toneladas de minério a partir de Corumbá é seguir por meio rodoviário, o que gera impacto nas rodovias e tem custo maior. 

O modal ferroviário ainda não está estruturado para absorver a demanda e dar mais dinâmica para o Estado. Com níveis negativos de altura do Rio Paraguai alcançados neste mês, a navegação para transporte de produtos pela hidrovia se torna inviável para o mercado, principalmente para as mineradoras que atuam em Corumbá, Vale e Vetorial.  

A régua de medição no 6º Comando do Distrito Naval de Ladário chegou ontem a nível negativo em 0,18 metro, o que representa 2,20 metros abaixo do nível da régua, inviabilizando o transporte de minério a partir de Ladário, tanto para o mercado interno como para a exportação.  Como a estiagem perdura desde o ano passado, o nível crítico de navegação tende a ser pior neste ano.

Dados do Centro de Hidrografia e Navegação do Oeste da Marinha do Brasil apontam que, em 20 de setembro de 2020, o nível do Rio Paraguai estava em 0,19 metro. O nível negativo só foi registrado a partir de 1º de outubro. 

A atual marca identificada na régua no mesmo dia deste ano é de -0,18 m – marca que ocorreu no ano passado em 9 de outubro. Em 2019, o mesmo dado aponta que níveis abaixo de 1 m na régua foram percebidos em 18 de novembro. O nível mais baixo registrado dois anos atrás foi de 0,85 m, em 1º de dezembro. Além da falta de chuvas, a redução do nível do rio tem ligação com a temperatura. 

A Embrapa Pantanal apontou que desde 2020 há uma elevação de 2ºC na região, em média. Com termômetros ultrapassando os 40ºC em diversos dias, esse calor causa uma evaporação muito maior na Bacia do Paraguai. 

O meteorologista Natálio Abrahão apontou que cerca de 140 ml de água evaporam por hora a cada metro quadrado do Rio Paraguai. “Ou seja, em 10 horas, o Rio Paraguai perdeu 1,4 litro de água por metro quadrado”, ressalta.

IMPEDIMENTO

Não existe uma regra estabelecida que impeça a navegação de embarcações que levam minério e outros produtos. 

Porém, o risco de a carga ficar encalhada é fator de consideração para o movimento de embarcações. Outra situação é o peso econômico na relação de custo entre o total que pode ser transportado e o valor que se paga por viagem, agregado ao risco de a carga ficar presa.

“Cabe ao comandante da embarcação, fundamentando-se no valor do seu calado, nas réguas do rio, nos avisos aos navegantes e nas cartas atualizadas, analisar se pode realizar a navegação com segurança ou não”.

“Ano passado, os comboios não navegaram porque não era economicamente viável para as empresas. Não houve restrição da Capitania Fluvial do Pantanal”, esclarece a Marinha do Brasil, em nota.

O secretário de Desenvolvimento Econômico e Sustentável de Corumbá, Cássio Costa Marques, afirma que as mineradoras estão com atividades suspensas para utilização da hidrovia no escoamento de minério. 

Ele comenta que não há previsão para esse transporte ser retomado, principalmente porque depende da elevação do nível do Rio Paraguai, que só ocorrerá após as chuvas. 

“Cada empresa determina sua logística. Esse escoamento é de cerca de três milhões de toneladas por ano”, comenta.

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Estiagem chegou mais cedo ao Rio Paraguai neste ano – Rodolfo César

Em nota, a Vale, maior extratora de minério de Corumbá, comunicou que ainda segue realizando embarques com embarcações de baixo calado, mas reconhece que o nível segue tendência de declínio e monitora a situação.

Com a hidrovia cada vez mais impossibilitada de uso, o minério precisa ser encaminhado por meio de caminhões, que têm custo de transporte mais caro e ainda causam repercussão no sistema rodoviário.  

A estimativa atual é de que há 400 caminhões trafegando diariamente no transporte de minério pela BR-262. 

“Elas [mineradoras] podem utilizar a rodovia como qualquer outro usuário, desde que mantenham controle sobre a carga por eixo, que é a exigência. E enquanto o mercado interno estiver buscando minério, aqui esse fluxo se manterá, pois não é carga de exportação, independentemente do rio”, analisou o secretário.

BOLÍVIA

O nível do Rio Paraguai tem impacto também no transporte de cargas que vão para a Bolívia. As embarcações têm destino até o país vizinho por meio do Canal Tamengo. 

Nesse trajeto, desde junho já ocorre impedimento das embarcações passarem por essa via com, principalmente, combustível, como o diesel, que é destinado para indústrias em Puerto Quijarro e Puerto Suárez.

Esse transporte de combustível passou a ser feito de Ladário para a Bolívia por meio rodoviário. Em média, de 20 a 25 caminhões transitam diariamente, conforme apurado com transportadoras instaladas em Corumbá. 

Há demanda para mais caminhões, porém, o desembaraço no Posto Esdras, da Receita Federal, ainda não possibilita que mais veículos cruzem a fronteira com essas cargas.

Marques ainda aponta que a viabilização da ferrovia é a estratégia modal mais adaptada para atender à demanda. 

Do lado brasileiro, a Malha Oeste ainda passa por processo de relicitação. O governo do Estado também elabora minuta para permitir que a ferrovia em Mato Grosso do Sul possa ser concedida por modelo de arrendamento.  

No âmbito da ferrovia para ligação internacional, também existem tratativas para ser criado um sistema modal que liga Corumbá ao norte da Argentina, passando pela Bolívia. Esse trajeto começou a ser discutido em 2017 e ainda há negociações em andamento.

 “O que melhoraria seria a ferrovia voltar a operar”, defende Cássio Marques.

PORTO MURTINHO

O Rio Paraguai, em Porto Murtinho, também apresenta queda nos níveis. A Marinha do Brasil divulgou ontem que o nível estava em 1,08 m, o que é 2,46 m abaixo do nível da régua e também fica aquém da medição de 1,50 m, considerada situação de alerta para navegação.

Conforme a Agência Fluvial de Porto Murtinho, o transporte de soja está paralisado e só deve ocorrer a partir de 2022. Há ainda o carregamento de cimento, que está sendo transportado do Brasil para o Paraguai. 

A produção de cimento na região é de 14,6 mil toneladas, enquanto a cal hidratada, que começou a ser produzida em agosto, alcança pouco mais de 164 toneladas.  

“O produto chega por meio rodoviário e só atravessa para o Paraguai por meio de barcaça até a rodovia. Aí segue por meio rodoviário novamente. Estamos exportando só cal hidratada e cimento”. 

“A seca afetou o rio, a safra da soja. As queimadas também prejudicaram muito os produtores”, observa Afonso Lima, diretor da Agência Fluvial de Porto Murtinho.

Fonte: Correio do Estado

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