Campo Grande (MS) – Auditores fiscais do Sindifisco-MS participaram da 1º edição do Fórum Internacional Tributário (FIT), em São Paulo e puderam ter contato com alternativas para aprimorar o sistema tributário brasileiro. Especialistas e estudiosos de 11 países, vindos de quatro continentes, participaram relatando os modelos de tributação de cada localidade.
O Brasil apresentou um estudo elaborado por mais de 40 especialistas, detalhando as falhas estruturais do modelo tributário nacional, em comparação com países desenvolvidos. Nomes de peso, como o economista irlandês Marc Morgan, trouxeram experiências para ajudar a apontar caminhos que possam tornar o sistema tributário brasileiro mais justo. Entre os assuntos tratados estão o sistema tributário europeu e dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a experiência da América Latina, evasão, paraísos fiscais e meio ambiente.
De acordo com o presidente do Sindifisco-MS, auditor fiscal Ronaldo Vielmo, a troca de informações foi bastante enriquecedora, uma vez que palestrantes de diferentes nacionalidades puderam expor os modelos de sistemas tributários, com experiências que podem ser absorvidas pelo Brasil. Vielmo destaca o contato com os modelos de tributação de países desenvolvidos como a Suécia e Dinamarca, onde a contraprestação dos serviços públicos ocorre em níveis elevados.
“Eles têm uma alta carga tributária, mas também um retorno muito grande para a população. A característica interessante é que quem financia a prestação de serviço público por meio dos impostos é a classe média. Tributam a renda em nível maior e o consumo em menor escala. Isso ocorre também nos países da Europa. Então o que fica evidente é que esses países conseguiram se desenvolver adotando modelos onde paga mais quem tem mais, isto é, tributam mais a renda (tributação progressiva) do que o consumo (tributação regressiva)”, pontua.
O auditor fiscal de MS, José Auto Júnior, reforça que a experiência internacional mostra que o Brasil está na contramão do que é praticado em países mais desenvolvidos, com um sistema regressivo com carga excessiva sobre o consumo. “Nosso sistema é muito bom para isentar a renda dos ricos e muito perverso para tributar o pobre. Não dá para viver em um país taxando muito quem não consegue sequer consumir os bens necessários para sobrevivência, enquanto um percentual extremamente ínfimo da população praticamente não paga tributo. Com a mudança certa na calibragem tributária podemos ter resultados significativos no crescimento da economia”.
Reforma
Para o auditor fiscal Bruno Gonzaga, ouvir a realidade dos diversos palestrantes foi importante pois possibilitou conhecer os pontos positivos e as dificuldades que cada modelo de tributação enfrenta. De acordo com Gonzaga, existe um movimento nacional dos integrantes do fisco pela reforma tributária no Brasil, por isso a elaboração do estudo brasileiro intitulado Reforma Tributária Solidária, liderado pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) com a gestão executiva da Plataforma Política Social e apoio do Conselho Federal de Economia (Cofecon); Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese); Fundação Friedrich Ebert Stiftung Brasil (FES); Instituto de Estudos Socciecoômicos (Inesc); Instituto de Justiça Fiscal (IJF) e Oxfam Brasil.
“O conteúdo é de muita importância para nós do fisco e para a sociedade como um todo. Trouxemos para o Estado um material com a proposta da reforma solidária porque acreditamos que tende a diminuir as desigualdades no Brasil. Para se ter uma ideia da importância do evento, devido ao ano eleitoral, houve palestra com os presidenciáveis para que pudéssemos conhecer as propostas de modelo tributário de cada um. O Congresso Nacional já está debatendo a reforma em suas comissões e por meio de audiências públicas. Então, essa é a oportunidade que temos de fazer realmente a tão aclamada justiça fiscal, garantindo a prestação dos serviços públicos à população brasileira”.
Desenvolvidos e em desenvolvimento
Um dos pontos mais debatidos pelos auditores que estiveram no evento é a relação entre tributação sobre renda e consumo. Pesquisa realizada pela Oxfam Brasil, com base em dados do ano de 2016 disponibilizados pela Receita Federal, mostra que brasileiros com rendimentos mensais superiores a 80 salários mínimos (R$ 63.040) têm isenção média de 66% de impostos, índice que pode alcançar 70% para rendimentos superiores a 320 salários mínimos mensais (R$ 252.160).
Já a isenção para a classe média (de três a 20 salários mínimos, ou seja, entre R$ 2.364 e R$ 15.760) é de 17%, baixando para 9% no caso de quem ganha entre um e três salários mínimos por mês (R$ 788 a R$ 2.364). A auditora fiscal da Receita Estadual de MS, Gigliola Lilian Decarli, frisa a palestra do professor da WP Carey School of Business, do estado do Arizona, o brasileiro Claudiney Pereira, que mostra que a tributação tem efeito direto na desigualdade social.
“Antigamente se entendia que a desigualdade era gerada pela má distribuição do dinheiro arrecadado, ou seja, não presto o serviço e o dinheiro fica concentrado na mão de poucos. O estudo apresentado nos mostra que na verdade, a desigualdade é gerada pela má tributação que é a que temos no Brasil, a regressiva (sobre bens de consumo). Então temos pessoas sem capacidade contributiva pagando muito mais do que quem tem capacidade contributiva. Isso mostra que o nosso sistema é muito ruim porque as nossas regras geram impacto direto na desigualdade social elevada que temos aqui no país”, alerta.
Gigliola é Diretora de Estudos Tributários da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite) e pontuou o crescimento da China como impressionante. De acordo com ela, a China tem características muito parecidas com as do Brasil, como a questão da corrupção, de porte continental e que também está passando por reformas importantes.
“Lá não se tributa propriedade, mas muito o consumo e pouco a renda como nós fazemos. Nesse momento eles também passam por reformas estruturais importantes, para poder tributar de forma mais eficiente. A diferença deles conosco é que conseguiram aplicar melhor o dinheiro e não estão passando por uma crise, mas estão em crescimento. Tenho certeza que esse fórum foi bastante enriquecedor para todos nós pois pudemos trocar experiências. É impressionante o trabalho feito nos países desenvolvidos e nos em desenvolvimento. Realmente é uma conta matemática: muda tributação e o resultado vem a longo prazo. Esse foi o grande ponto positivo do evento: poder confirmar as premissas que a gente tinha elaborado ao longo dos estudos”, finaliza.