Reforma da Previdência precisará ser mais dura

Publicado em: 02 jul 2018

Campo Grande –  Coordenador das propostas econômicas de Henrique Meirelles, o economista José Márcio Camargo afirma que, se eleito, o ex-ministro da Fazenda poderá levar adiante uma proposta de reforma da Previdência ainda mais dura que a original –apresentada pelo governo de Michel Temer no final de 2016. 

“Dado que já terão se passado mais de 2 anos desde o início do processo, a situação fiscal terá se complicado ainda mais”, disse o professor da PUC-Rio em entrevista ao Poder360.

Segundo ele, pode haver redução do tempo de transição para se chegar à idade mínima ou do período para equiparação entre os sistemas público e privado de aposentadoria. A adoção de 1 sistema de capitalização também está em discussão. 

Entre as reformas prioritárias para o governo Meirelles, estariam, ainda, a que simplifica o sistema tributário e a que desvincula o Orçamento da União. “Hoje, 92% das despesas são vinculadas, o governo não tem nenhum controle de como gastar. Isso tem que acabar.” 

O economista afirmou que propostas para educação e saúde também são prioridades no programa de governo. Na área de saúde, querem aumentar o acesso da população a serviços privados, como seguros de saúde e clínicas populares. Na educação, planejam expandir o Prouni para a educação básica. 

Em relação às privatizações, Camargo disse que, a princípio, qualquer empresa poderia ser desestatizada. “Vamos fazer o que for mais eficiente para a economia, o que provavelmente significa privatizar todas as empresas.” 

Leia trechos da entrevista: 

Poder360: Como é ser o assessor econômico de 1 ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do BC?

José Márcio Camargo: Realmente, é 1 desafio. Acho que ele foi 1 excelente ministro da Fazenda e presidente do Banco Central. Tanto em 2003 quanto em 2016, a economia brasileira estava em uma situação extremamente complicada e ele conseguiu fazer uma reviravolta. Trabalhar com uma pessoa que tem esse histórico é 1 grande desafio, mas ao mesmo tempo é muito bom, porque ele tem ideias, sabe o que quer e o que tem que ser feito. 

O senhor é próximo ao Meirelles e ao presidente Temer. Como se deu essa aproximação?

Eu conheci o ministro Meirelles mais proximamente nas discussões das reformas que foram implementadas ao longo dos 2 anos de mandato do presidente Temer. Nas discussões sobre o teto dos gastos, reforma trabalhista e reforma da Previdência me encontrava com os 2 para discutir os projetos, como apresentá-los aos deputados e convencê-los da importância das propostas. 

Qual reforma da Previdência será proposta pelo governo Meirelles? Será uma mais parecida com a inicialmente apresentada pelo governo Temer, que trazia condições mais duras?

A proposta inicial foi feita quando o ministro Meirelles estava no comando. Ou seja, caso se eleja, certamente vamos propor alguma coisa parecida com o que foi proposto no início do processo. Agora, dado que já terão se passado mais de 2 anos, a situação fiscal terá se complicado ainda mais. O deficit da Previdência está aumentando sistematicamente todos os anos. Isso significa que muito provavelmente teremos que fazer uma proposta ainda mais dura.

O que teria que ser mais duro?

O período para se chegar à idade mínima pode ser 1 pouco menor. Precisamos estudar isso com cuidado. Também há a questão da adaptação do regime de aposentadoria dos servidores públicos, que hoje é extremamente concentrador de renda e desigual. Lá atrás, foi proposta a aproximação com o regime do setor privado, para torná-los similares. Podemos fazer com que essa equiparação ocorra mais cedo do que na proposta original. Mas, além disso, dado o envelhecimento da população brasileira, nós vamos ter que transitar pelo menos em parte para 1 sistema de capitalização. Não é uma coisa que está em pauta no curto prazo, mas, em algum momento no futuro, isso terá que ser discutido.

 Quais outras reformas são consideradas prioritárias?

Além das pequenas reformas microeconômicas que já estão sendo feitas, o país precisa de uma reforma tributária e, mais ainda, de uma reforma orçamentária. O Orçamento do governo federal é totalmente vinculado, 92% das despesas são vinculadas, o governo não tem nenhum controle de como gastar. Isso tem que acabar. A nossa proposta é desvincular o Orçamento e torná-lo impositivo. Ou seja, uma vez aprovado pelo Congresso, ele deve ser aplicado pelo presidente ao longo do ano. Coisa que hoje não acontece com a parte que sobra. Queremos tornar o processo de definição do Orçamento realmente importante, como em qualquer democracia madura. 

Além disso, nossa ideia é fazer uma reforma tributária, por meio de emenda constitucional, que substitua os impostos como PIS, Cofins, ICMS e ISS por 1 IVA, imposto de valor agregado de nível nacional, de forma a simplificar o sistema. 

Estamos preocupados também com a parte social, principalmente com educação e saúde. Desenvolvemos  1 programa para saúde que é fundamentalmente para aumentar as opções de acesso da população a seguro de saúde e clínicas populares. Na educação, a nossa ideia é estender o Prouni [Programa Universidade para Todos] para creches, pré-escolas e ensino fundamental. Queremos dar ênfase total ao ensino infantil. 

A ANS autorizou reajustes de até 10% para planos de saúde. Milhares de brasileiro deixaram de poder pagar pelo serviço. Como pretendem aumentar o acesso da população a esses produtos?

Dada a legislação existente sobre seguro, ou a pessoa faz 1 seguro que cobre tudo e, portanto, é extremamente caro, ou fica no SUS [Sistema Único de Saúde]. Nossa ideia é mudar a legislação para que as empresas de seguro possam oferecer diferentes produtos, não apenas os que cobrem tudo. Por exemplo, se a pessoa está preocupada com a situação cardíaca, o seguro pode oferecer uma opção que cobre só essa especialidade. A ideia é liberar as empresas, obviamente com controle da ANS [Agência Nacional de Saúde Suplementar], para oferecer diferentes seguros, de forma com que o preço caia. A ideia é oferecer 1 serviço privado que atraia parte da clientela do SUS. 

O teto de gastos e a regra de ouro serão grandes desafios para 2019. Como construir 1 plano econômico considerando essas limitações?

Temos 1 problemas com o teto de gastos. Por isso, é fundamental fazer uma  reforma orçamentária que permita ao governo mudar a estrutura do gasto. Na hora que liberar a estrutura orçamentária, poderemos realocar recursos para áreas consideradas prioritárias. O teto também só é viável com reforma da Previdência. O próximo governo ou rompe com o teto dos gastos, o que seria 1 desastre do ponto de vista econômico, ou faz uma reforma da Previdência nos próximos 2 anos. 

Outra coisa é a regra de ouro. Existe uma PEC que foi apresentada pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) que pretende mudar a questão da regra. Propõe usar 1 esquema similar ao que existe em relação ao teto de gastos: quando o governo vai chegando perto de desrespeitar a regra, você começa a proibir aumento de gastos, aumento de salário do funcionalismo, contratação de novos funcionários etc. Dessa forma, em 5 anos volta-se a cumpri-la. 

A taxa básica de juros da economia brasileira está no menor patamar histórico, de 6,5% ao ano. É possível manter taxas tão baixas?

Isso depende das reformas. Se o próximo governo continuar fazendo as reformas necessárias, acho que a tendência é manter juros relativamente baixos durante muito tempo. Se as reformas pararem, certamente em algum momento vamos ter problema. O maior problema da economia brasileira é fiscal. Sem uma reforma que mude a estrutura do gasto público, a economia não vai a lugar nenhum. 

Quais setores pretendem privatizar? Alguns devem ser mantidos na mão do Estado?

Em princípio, qualquer empresa pode ser privatizada. Isso não significa que o governo Meirelles vai privatizar toda as empresas. Estamos discutindo como privatizar. A forma como a Eletrobras pode vir a ser privatizada (que é pulverizando o capital da empresa, tirando o controle do Estado e evitando os monopólios privados) talvez seja a forma mais eficiente. Principalmente para empresas como Petrobras, Banco do Brasil… Vamos fazer o que for mais eficiente para a economia, o que provavelmente significa privatizar todas as empresas que estão aí. Nosso objetivo é pensar como fazer a economia crescer, sem gerar inflação, para criar empregos.

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