Campo Grande (MS) – No início do segundo ano do terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se vê às voltas com a necessidade de dar uma resposta às demandas do Congresso Nacional e do empresariado por meio de uma reforma administrativa.
Embora a equipe liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não veja a reforma na estrutura pública como principal mecanismo de contenção de gastos, mudanças são exigidas como sinalização de que a gestão petista está empenhada em aprimorar o serviço público.
A posição da equipe econômica é promover a eficiência de gastos públicos, incluindo não só renúncias tributárias como também a revisão de demais despesas. A reforma administrativa, porém, não é encarada como impactante em termos de número.
Frente a isso, o governo federal procura implementar, ao longo de 2024, uma reforma infraconstitucional, isto é, via projetos de lei e medidas internas de gestão adotadas pelos ministérios.
Nesse cenário, está descartado o apoio à votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 32/2020, elaborada pelo ex-ministro da Economia Paulo Guedes e parada na Câmara desde setembro de 2021. E tampouco se estuda a apresentação de outra PEC para uma nova organização administrativa.
O texto de Guedes, inclusive, é o defendido pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que prega “urgência” para tratar o tema.
“Nós conseguimos aprovar um texto, que ainda pode ser alterado pelo Plenário, que parte de uma premissa muito simples: ele não mexe em direito adquirido de quem quer que esteja hoje no serviço público”, comentou Lira, em dezembro de 2023. “Então, essa vendeta de que nós estamos a terceirizar e a acabar com o serviço público no Brasil não é verdade”, alegou.
Para fontes da Fazenda, a PEC 32 fortalece militares e altos cargos e penaliza o servidor comum. Isso porque as mudanças estruturais, como redução do salário inicial, valeriam apenas para os novos convocados, sem efeito direto aos funcionários da ativa.
Entretanto, estão no horizonte apoio a projetos que tramitam no Congresso e prosseguimento de ações encaminhadas pela gestão de Lula. Veja quais são:
Programa de Gestão de Desempenho
Ainda em maio do ano passado, foi instituído o novo Programa de Gestão e Desempenho (PGD) para servidores públicos federais, que prevê um processo de acompanhamento das atividades realizadas, com foco na entrega por resultados e na qualidade dos serviços prestados. Dessa forma, os servidores pararam de bater ponto no trabalho.
A norma regulamentou o teletrabalho no funcionalismo público federal, o que permitiu a execução do chamado home office de forma permanente ou parcial, com os termos acordados entre funcionários e gestores. A modalidade não será disponibilizada para servidores caso seja considerado que o trabalho remoto causaria “prejuízo para a administração”.
Como militares das Forças Armadas foram excluídos da iniciativa, alguns integrantes do governo demandam ações destinadas especificamente a esse grupo.
Neste começo de ano, o governo começou a dar os primeiros passos para maiores regulamentações de forma geral ao PGD e estabeleceu normas sobre hora extra, adicionais de insalubridade, auxílio-transporte e banco de horas.
Projeto que limita os supersalários
Haddad manifestou apoio ao projeto que limita os supersalários de agentes públicos (PL nº 6.726/2016), aprovado pela Câmara e aguardando análise do Senado Federal.
Segundo o ministro, a proposta pode sinalizar “esforço de modernização, moralização, valores e princípios básicos para nós termos um Estado mais moderno”.
A defesa é de que todos os Poderes cortem “na própria carne”, não apenas o Executivo. A maior parte dos supersalários está concentrada no Judiciário, por exemplo.
Além disso, há críticas ao corte de gastos em um momento em que o Congresso aumentou o fundo eleitoral destinado às eleições municipais deste ano e as emendas parlamentares.
Reestruturação de carreiras
Em 2023, o governo reestruturou algumas carreiras de forma pontual. Foi o caso dos servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), os analistas em Tecnologia da Informação (ATI) e os analistas técnicos de Políticas Sociais (ATPS).
Embora haja demandas em diversas outras categorias, outras decisões ainda não foram tomadas. Mas há promessas de que as carreiras sejam reestruturadas para além de demandas remuneratórias (isto é, via reajustes salariais).
Concurso Nacional Unificado
Em maio, o governo federal vai realizar a primeira edição do Concurso Nacional Unificado (CNU), também apelidado de “Enem dos Concursos”. A prova única, que vai selecionar mais de 6 mil servidores para 21 órgãos da administração pública, deve trazer aprendizados para a gestão pública. Há estimativa de economia de recursos com a aplicação de uma prova só em todo o país.
A expectativa é de que outras edições da prova sejam realizadas. Um eventual segundo edital ocorreria apenas na virada de 2025 para 2026, e a questão está sob avaliação “muito criteriosa”, segundo Regina Camargos, secretária adjunta de Gestão de Pessoas, do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI).
Além disso, a equipe econômica — que inclui, além de Haddad, as ministras Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos) e Simone Tebet (Plenejamento e Orçamento) — indicou apoio ao projeto que altera as regras para realização de concursos públicos (PL nº 2.258/2022). Na visão dos ministros, o texto pode trazer mudanças estruturais para a forma de contratação de servidores.
Digitalização dos serviços públicos
Em outra frente, mas que também dialoga com a contratação pública, os ministérios têm implementado a digitalização dos serviços públicos como forma de otimizar o trabalho.
Segundo dados de janeiro de 2024, a porcentagem de serviços digitais ainda está em 90% —o número absoluto é de 4.260 serviços. O governo federal também tem apoiado outros entes da federação com a disponibilização de produtos em que o cidadão se utiliza da sua conta Gov.br para acessar serviços estaduais e municipais, como o login único, prova de vida e assinatura digital.
Não concessão de reajustes
Dentro desse escopo, a decisão por não conceder reajuste salarial a servidores em 2024 é encarada ainda como uma forma de o governo mostrar compromisso com o corte de gastos.
Ministra sobre negar reajuste a servidor: “Responsabilidade fiscal”
Devido à restrição orçamentária, o governo anunciou que não vai ajustar as remunerações neste ano, dando apenas um aumento de 51,06% em auxílios. O auxílio-alimentação será elevado de R$ 658 para R$ 1 mil; o per capita referente ao auxílio-saúde passará do valor médio de R$ 144 para R$ 215; e o auxílio-creche irá de R$ 321 para R$ 484,90.
Para os anos de 2025 e 2026, foi proposto reajuste de 9%, que será pago em duas parcelas de 4,5%: a primeira, em maio do próximo ano, e a segunda, em maio do ano seguinte.
Próximos passos
Na quarta-feira (17/1), o ministro Fernando Haddad recebeu Esther Dweck para endereçar o assunto. Nenhum dos dois deu declaração pública após a reunião.
Fonte: Metrópoles