Campo Grande (MS) – Embora a agenda da transformação do Estado mobilize setores importantes do governo, do Congresso e da sociedade, o cenário político de 2024 parece pouco favorável para o avanço dessa agenda no Legislativo.
Se por um lado o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não tem apoio para aprovar sua proposta de reforma administrativa, materializada na PEC 32, por outro, o governo ainda precisa se articular no Legislativo para acelerar o trâmite de iniciativas que poderiam ocupar esse espaço.
No caso da reforma pretendida por Arthur Lira, o avanço ficou mais distante depois do tom duro adotado pelo presidente da Câmara, na reabertura dos trabalhos da Casa, no último dia 5.
A avaliação entre lideranças partidárias ouvidas pelo JOTA é a de que Lira não deve contar com o apoio de parte expressiva do centrão para o avanço da PEC 32 no curto prazo.
Por trás do distanciamento de aliados do presidente da Câmara, que se mantêm longe do tema, está o atual cenário político. Deputados do centrão têm simpatia por uma reforma constitucional relacionada ao funcionalismo. Porém, esses mesmos parlamentares avaliam que a PEC 32 tem a pecha de ser “a reforma de Bolsonaro”. E esse carimbo obstrui qualquer diálogo com o Executivo.
“Parece criptonita”, como refletiu, em conversa com a newsletter Por Dentro da Máquina, um importante interlocutor desse grupo político.
Nesse contexto, falar de PEC 32 é, antes de tudo, comprar briga com o Planalto e reforçar a centralidade de Lira no processo sucessório da Casa, que já teve início nos bastidores. No centrão, é cada vez maior o contingente que não deseja nem uma coisa nem outra.
O controle da pauta é um dos instrumentos mais fortes que o presidente da Câmara tem para pressionar o Executivo. E a ideia de Lira é usar a PEC para forçar o governo a entrar no debate de redução de despesas, mesmo que o texto não tenha esse condão, na avaliação de especialistas do Executivo, do Legislativo e da sociedade civil.
Apesar da falta de apoio na Casa, os principais interlocutores do presidente da Câmara asseguram que ele não jogou a toalha. Pelo contrário. Será uma eterna carta na manga para ser lançada no momento oportuno.
“Todos sabem que defendo uma reforma administrativa que atualize o serviço público brasileiro. Trata-se de uma proposta que mantém conquistas, mas que acima de tudo busca racionalidade, eficiência e uma melhor prestação de serviço à população”, afirmou Arthur Lira, na abertura do ano legislativo.
A agenda alternativa em marcha lenta
Se o presidente da Câmara, Arthur Lira, está sem força para enfrentar o governo com a PEC 32, seria lógico supor que o caminho estaria livre para o Executivo avançar na sua própria agenda de transformação do Estado. Porém, a falta de articulação política do Planalto e a agenda eleitoral empurram esse debate para o fim da fila.
Um parlamentar com grande trânsito em diferentes bancadas anota que, até agora, não se vê afinco do governo para articular a aprovação de matérias como o PL dos concursos e dos supersalários, que tramitam no Senado. Avalia como “muito tímida” a atuação dos membros do primeiro escalão do governo em relação a esses temas.
De fato, o governo, que está mergulhado na preparação do primeiro Concurso Nacional Unificado (CNU), dá sinais de que só pretende atuar com mais empenho no Congresso a partir de agora. Importante notar que a necessidade de uma atuação mais forte no Congresso coincide com o aumento da participação do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, na conversa com o Legislativo.
Representantes dos sindicatos na Câmara Técnica de Transformação do Estado, ligada ao “Conselhão” da Presidência da República, defenderam, há duas semanas, que o governo fizesse barulho, com um pacote de medidas. Mas a ministra Esther Dweck, da Gestão e da Inovação, sinalizou, em entrevista à rádio Eldorado, que não deve seguir esse caminho.
No Senado, na abertura do ano legislativo, o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) não listou os temas tratados como importantes para a máquina pública entre as prioridades para 2024. Além disso, é pouco provável que o Judiciário, afetado diretamente pelo PL dos supersalários, observe seu avanço de braços cruzados.
No caso do PL dos concursos, não há nem mesmo um relator designado, apesar de um inédito espaço para convergência entre governo, sindicatos e terceiro setor.
Em paralelo a isso, o calendário eleitoral pouco colabora com o avanço dessas matérias, que exigem negociação e têm força para desgastar segmentos do Congresso junto ao seu próprio eleitorado.
De acordo com um parlamentar que conhece o tema de perto, nada será discutido antes do dia 5 de abril. Até lá, estará aberta a janela para trocas partidárias e formação de federações para as eleições municipais de outubro. Quando a janela fechar, a agenda será outra: a eleição municipal em si.
Fonte: JOTA