Equipe econômica se reuniu com o presidente Lula ontem e anunciou o congelamento de R$ 15 bi em gastos públicos deste ano
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou na quinta-feira, 18, um congelamento de R$ 15 bilhões no Orçamento para cumprir as regras fiscais deste ano em meio à frustração com receitas extras e ao aumento acima do esperado de despesas obrigatórias, aquelas que o governo não pode deixar de pagar, como salários e aposentadorias.
Haddad explicou que, desse total, R$ 11,2 bilhões são de um bloqueio, feito devido a estimativas de gastos que superam o limite do arcabouço fiscal. Os outros R$ 3,8 bilhões são relativos a um contingenciamento, em função de arrecadação insuficiente para alcançar a meta de déficit zero, ou seja, de igualar receitas e despesas.
A cifra bloqueada representa uma fração pequena do total do Orçamento. Equivale a 9% do custo total do Bolsa Família e 7% das despesas não obrigatórias, livres para a escolha do governo.
O que é bloqueio e contingenciamento na política fiscal
Há uma diferença técnica entre “bloqueio” e “contingenciamento”. O primeiro ocorre quando há um crescimento de despesas obrigatórias, como a Previdência, e é preciso controlar gastos não obrigatórios — isso é necessário para não estourar o limite de gastos previsto no arcabouço fiscal.
O contingenciamento acontece quando há frustração de receitas, ou seja, a arrecadação é menor que a esperada. Nesse caso, é necessário segurar gastos enquanto não melhora a entrada de recursos para cumprir a meta fiscal até o fim do ano. Neste ano, a meta é de déficit zero, com uma margem de tolerância de 0,25% do PIB, pouco menos de R$ 30 bilhões.
Já no bloqueio, o governo pode escolher quais programas serão afetados pelos cortes, não é uma redução linear de gastos, como no caso do contingenciamento. Isso é feito quando o problema não está na arrecadação, mas no aumento fora do esperado de gastos obrigatórios, como o pagamento de salários, aposentadorias ou precatórios.
E o dinheiro pode ser liberado?
Tanto no bloqueio quanto no contingenciamento o dinheiro de determinada despesa pública afetada pode ser liberado ao longo do ano. As duas medidas podem ser revertidas se o próximo relatório bimestral do Tesouro apontar melhora nos indicadores de arrecadação e/ou despesas fixas, entre outros monitorados e projetados pela equipe econômica.
Mercado
O bloqueio e o contingenciamento são instrumentos da política fiscal do governo que está sempre no radar do mercado financeiro. Os investidores olham para essas medidas para avaliar se o governo será capaz de cumprir a meta fiscal que estabelece no Orçamento de cada ano.
O valor de R$ 15 bilhões anunciado hoje não deve surpreender o mercado financeiro, que via um corte de R$ 10 bilhões como um piso necessário para garantir a credibilidade do arcabouço fiscal diante do crescimento das dúvidas sobre o compromisso do governo com a meta.
A maioria dos analistas, contudo, considera que é necessário um valor maior para realmente fazer frente ao aumento inesperado de gastos e à decepção com arrecadação nos julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e de transação tributária.
No caso do banco inglês Barclays, o economista-chefe para Brasil, Roberto Secemski, avalia que o ajuste deve ficar entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões, entre contingenciamento e bloqueio, embora abaixo dos cerca de R$ 30 bilhões necessários para preservar a regra de gastos e a meta de primário.
“O quanto maior for o montante congelado em 22 de Julho, melhor será para a credibilidade da meta zero neste conjuntura, já que a medida mostraria o compromisso do governo Lula com o orçamento fiscal metas, mesmo que isso exija sacrifícios políticos para reduzir gastos discricionários.”
O Itaú Unibanco chegou a “avisar” que cortes muito pequenos poderiam disparar uma reação negativa dos ativos financeiros. No início do mês, o dólar chegou a bater R$ 5,70 em meio a repetidas entrevistas de Lula em que o chefe do Planalto questionava a necessidade de corte de gastos.
O Itaú fez uma revisão em suas projeções para os indicadores da economia com base em um “bloqueio significativo” de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões nas despesas no relatório da próxima segunda.
“Uma eventual frustração nessa frente traria um relevante dano de credibilidade para o arcabouço fiscal e a política econômica em geral, com impactos potencialmente significativos sobre preços de ativos, quiçá análogos aos observados nas últimas semanas”, disse o Itaú Unibanco, em relatório.
Fonte: EXAME