Campo Grande (MS) – Com promessa de ser uma das maiores processadoras de milho, a megaindústria que seria instalada em Maracaju segue desacreditada. O governo do Estado, que era entusiasta com as promessas de investimento de US$ 1,21 bilhão (convertido em mais de R$ 6 bilhões atualmente), já não acredita em um retorno breve dos investidores.
O titular da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), Jaime Verruck, disse ao Correio do Estado que caso o projeto seja retomado será com uma estrutura menor.
“Na minha avaliação, eles devem ter errado muito na estratégia deles, e eu não acredito que eles venham a ter o empreendimento que tinham sinalizado lá atrás. Ao longo desse tempo, eles demoraram tanto [para concretizar a indústria] que outras empresas entraram nesse segmento”, avalia Verruck.
“A retomada desses chineses vai ser muito lenta, eu não acredito que no curto prazo retomem aquela obra da BBCA. Se retomarem, que é o que eles estão sinalizando, vão retomar com um processo menor que eles planejavam”, completou.
Desde 2015, o empreendimento ficou na promessa. O BBCA Group, grupo chinês, prometeu que o investimento traria a geração de até mil empregos diretos e indiretos.
Conforme divulgado na época, a indústria esmagadora planejava processar 200 mil toneladas de milho por ano somente na produção de amido e farelo do cereal. Ainda havia a promessa de produzir ácido polilático (PLA), material utilizado em produtos biodegradáveis, como copos.
Indústria de processamento de milho em Maracaju – Arquivo/Correio do Estado
INCENTIVOS FISCAIS
As tratativas e as conversas do grupo chinês com as gestões estadual e municipal começaram ainda em 2013. Em 2015, o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) formalizou a parceria do Estado com os investidores do BBCA Group, e o Banco de Desenvolvimento da China (China Development Bank – CDB), este último sendo o financiador da indústria esmagadora de grãos.
Na época, o governo estadual se comprometeu a ser proativo e facilitar o desenvolvimento do projeto, disponibilizando todos os documentos para o processo de avaliação dos empréstimos e concedendo incentivos fiscais.
No mesmo ano, o então prefeito de Maracaju sancionou por meio da Lei nº 1852 de 2015 a doação de 102 mil hectares para a empresa.
“Uma gleba de terras pastais e lavradias com denominação de Fazenda Santa Rosa – Gleba B, com área total de 102,3385 hectares, avaliado pela Comissão Permanente de Avaliação de Imóveis no valor de R$ 3,070 milhões, à empresa BBCA Brazil Industrial e Investimentos LTDA”, detalha o decreto.
O secretário explica que os incentivos que seriam concedidos pelo Estado não chegaram a ser utilizados pelo empreendimento.
“A indústria chinesa nunca usou incentivos fiscais, então ela não tem débitos com o governo do Estado. A prefeitura da Maracaju notificou para que eles devolvessem parte do terreno que a prefeitura concedeu, em função dela não ter cumprido o investimento”, analisa Verruck.
“Os chineses cada vez que a gente aborda eles têm uma desculpa. Tanto que os armazéns estão arrendados para a cooperativa Lar, se alguém for lá até vai ver que tem uma movimentação econômica. Mas não tem nada a ver com eles”, completou.
O secretário de Infraestrutura (Seinfra), Eduardo Riedel, disse que existe um conjunto de medidas de incentivo, e se a indústria não ocorrer, o estímulo é retirado.
“A gente exige que a empresa leve adiante os seus empreendimentos. Então aquilo [incentivo] foi conquistado lá atrás e por várias razões a indústria tem atrasado seu cronograma. O papel do governo é monitorar para ver o empreendimento realizado”, avalia Riedel.
CRONOGRAMA
Conforme adiantado pelo Correio do Estado, a prefeitura de Maracaju já notificou a empresa pedindo o cronograma de obras e, caso não haja um retorno efetivo, cogita pedir a área de volta.
O secretário municipal de governo de Maracaju, Frederico Felini, diz que a legislatura vigente no município permite, “em último caso”, que o pedido de devolução seja feito diante da falta de comparecimento do grupo de investidores.
Segundo ele, o Executivo municipal conversou com o grupo de investidores asiáticos no início do ano, mas, em decorrência da pandemia de Covid-19, o BBCA Group decidiu aguardar o avanço da vacinação nos dois países.
Seis meses se passaram, e, com a imunização em progresso, Felini voltou a entrar em contato com a empresa, agora por meio de ofício, pedindo um cronograma relacionado às obras no local.
“Enviamos um ofício ao BBCA [em junho], mas ainda não obtivemos respostas. Com retorno dos investidores, vamos especificar a tabela de prazos. Em caso de descumprimento daquilo que foi acordado, vamos agir de acordo com a legislação municipal vigente”, afirmou Felini.
Verruck também aponta que houve uma conversa com o grupo no mês de março.
“Eles estiveram conosco na secretaria, falaram que iam dar continuidade no empreendimento fazendo algumas modificações, mas isso não aconteceu até o momento. Já foram notificados, mas, como eles não usaram incentivos, a gente não tem o que cobrar deles”, finaliza o secretário.
“É óbvio que eles podem até vir a desistir caso eles queiram. Mas no caso da prefeitura, sim, eles fizeram uma aquisição de área e a prefeitura já notificou eles. Ela quer a devolução do terreno, não onde está a obra, mas a área que é deles. O último contato que nós tivemos com eles foi em março”, completa.
PROMESSA
A fábrica de Maracaju seria uma unidade industrial química a partir do processamento do milho e da cogeração de energia. Segundo informado em 2019, a primeira unidade consumiria US$ 100 milhões em investimentos.
O restante dos investimentos – superiores a US$ 1 bilhão – seriam aplicados na fabricação de produtos químicos voltados à indústria alimentícia e de embalagens.
A planta ainda atuaria na cogeração de energia. No auge, a estimativa seria processar 1,2 milhão de toneladas de milho.
Com capacidade de produção anual de 150 mil toneladas de ácido cítrico, 60 mil toneladas de xarope de maltose, 300 mil toneladas de amido de milho, 60 mil toneladas de dextrose cristalina, 150 mil toneladas de lisina e outros subprodutos relacionados.
A capacidade levaria a chinesa ao topo da produção mundial de ácido cítrico, além de consolidar o grupo como um dos maiores produtores de vitaminas A, B, C e E. Em uma segunda etapa, os chineses processariam 170 mil toneladas de óleo de soja e 810 mil toneladas de polpa de feijão.
Fonte: Correio do Estado