Guerra tributária e a reforma necessária

Publicado em: 28 maio 2019

Campo Grande (MS) – O Correio Braziliense de segunda-feira (27.05)  traz texto do presidente da Febrafite, Juracy Soares, no caderno Opinião sobre a Reforma Tributária.  No artigo, Soares alerta que, apesar do consenso acerca da sua necessidade, ela corre sérios riscos de virar novamente alvo de disputa entre representantes do Executivo, Legislativo e até do setor privado, no jogo de empurra-empurra de interesses político-econômicos, e não avançar. 

Leia abaixo a íntegra do artigo, que também está disponível nas versões impressa e digital do jornal. 

Guerra tributária e a reforma necessária 

Apesar do consenso acerca da necessidade de ampla reforma tributária no país, ela corre sérios riscos de virar novamente alvo de disputa entre representantes do Executivo, Legislativo e até do setor privado, no jogo de empurra-empurra de interesses político-econômicos, e não avançar. Há mais de 30 anos, o tema é discutido nas esferas de governo. Aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados nesta quarta, dia 22, a proposta apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) é a aposta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e de líderes do grupo de partidos batizado de Centrão, que inclui PP, PR, PRB e Solidariedade. Pela União, o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, tem dito que o governo trabalha para encaminhar uma proposta para modificar o modelo tributário nacional, a iniciar pela simplificação dos impostos federais: PIS, Cofins e IPI. E só na segunda etapa entrariam os impostos estaduais e municipais. 

O fato é que, enquanto se discute o melhor modelo para dividir o bolo tributário e a fantástica conta do “ninguém sai perdendo”, o país passa por período de baixíssimo crescimento econômico e estagnação da produtividade, em que reformas estruturais, tanto no campo macroeconômico quanto no microeconômico, são fundamentais para a retomada do crescimento. Com sete estados em calamidade financeira, a situação desses entes subnacionais é ainda mais grave e qualquer medida que possa representar uma aspirina poderá complicar a situação fiscal. 

O grande problema é que, para a União, a Previdência é mais importante. Já para os governos regionais, a reforma tributária representa o começo do fim de várias distorções. Até porque a União desonera tributos partilhados com estados e municípios e majora tributos não partilhados. Os estados estão com imposto cada vez mais obsoleto, receitas de transferência baixa, além de uma série de outros problemas fiscais. 

Como tem demonstrado o Centro de Cidadania Fiscal (Ccif), com o apoio de entidades do fisco, entre elas a Febrafite, o país precisa de ampla reforma para reduzir a complexidade, a insegurança jurídica e a iniquidade tributária. Segundo o think tank, a complexidade do sistema é notável entre os tributos sobre bens e serviços (PIS/Cofins, IPI, ICMS e ISS), em que bases parciais e superpostas requerem classificação/distinção, além de proliferarem as renúncias fiscais, os regimes especiais, as isenções e reduções de bases de cálculo, cuja regulação é feita por milhares de leis, portarias e decretos emitidos nas três esferas de governo. 

Essa guerra fiscal desestrutura as finanças estaduais e, muitas vezes, somos obrigados a remanejar capítulos inteiros na legislação para atender a uma única empresa porque ela “exige” um tratamento tributário diferenciado, fora a questão da defasagem na correção da Tabela do Imposto de Renda e a falta de política de correção periódica que reflita a variação da renda média do contribuinte, como defende há anos o Sindifisco Nacional. O fato é que o país necessita abandonar o sistema tributário atual, ineficiente para os padrões de hoje. Bom lembrar o relatório Doing Business, do Banco Mundial, de 2018, o qual mostra que, entre 190 países, o Brasil aparece na 184ª posição no critério “pagamento de impostos”, e em último lugar onde as empresas gastam mais tempo para calcular e pagar tributos: 1.958 horas por ano em média. 

Se é óbvio que temos um sistema tributário disfuncional, por que ela não sai do papel? Além das disputas políticas, há interesses privados contrários às mudanças. Especialmente os beneficiados pelas renúncias tributárias, entre outros privilégios fiscais, sendo interessante manter a situação como está e o custo depois vem para o setor público e para todos nós que pagamos a conta. 

Com o tema de volta à pauta, é importante ressaltar que uma reforma ideal deve ser a que tenha como características a neutralidade, a equidade, a simplicidade e a transparência a fim de não distorcer a forma de organização das empresas e permitir ponderar a carga tributária para que ela se mantenha sem privilégios no tratamento com os contribuintes. O momento exige um pacto nacional maior, com efetiva participação e aceitação da União, estados e municípios. Devemos avançar para resgatar a confiança de empreendedores, promover ambiente amigável à geração de negócios, emprego e renda. Afinal, a redução do custo de calcular tributos no Brasil e promover um ambiente propício à instalação de novas empresas e o crescimento das atuais deve ser busca de todos pelo bem da nação. 

É natural, portanto, que, em tempos de crise, surjam com mais força no cenário político críticas ao modelo, à carga tributária e o discurso de que é preciso achatar os gastos do Estado. É preciso fazer a reforma do Sistema Tributário Nacional, desde que preserve o Pacto Federativo, não desestabilize ainda mais os serviços públicos, com diminuição da presença do Estado, de que tanto necessita a sociedade brasileira, composta na maioria por pobres. 

 

*Juracy Soares, doutor em Ciências Jurídicas (UMSA/Arg), mestre em Controladoria pela UFC, graduado em Direito e Contabilidade pela UFC, auditor fiscal e presidente da Febrafite (Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais).

 

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