Artigo: Reforma tributária para distribuir renda

Publicado em: 24 maio 2022

Por Renê de Oliveira Garcia  Junior* e Tomaz Leal**

Campo Grande (MS) – Estudo recente do Banco Mundial apresenta a carga tributária sobre as diferentes faixas de renda do consumidor brasileiro. Os autores descrevem o impacto dos impostos indiretos (ICMS, IPI, ISS, PIS/Cofins) sobre a renda per capita domiciliar disponível, usando para isso a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) desenvolvida pelo IBGE. Os resultados são alarmantes, embora não surpreendentes para quem acompanha o tema.

Em primeiro lugar, chama a atenção o consumo per capita mensal dos 10% mais ricos chegar a 13 vezes o dos 10% mais pobres, ilustrando nossas disparidades sociais. Além disso, a cesta de consumo dos domicílios mais pobres tem carga tributária estimada de 21% da renda per capita; a dos mais ricos, de 12%. O estudo avalia o impacto de uma transição do atual modelo tributário brasileiro para um IVA similar ao proposto na reforma tributária hoje no Congresso, com alíquota única de 26,9%. O resultado esperado é uma melhora na distribuição da carga tributária e, em consequência, na distribuição de renda.

A alta complexidade da estrutura tributária brasileira, além de prejudicar o consumo dos mais pobres, atinge em cheio o setor produtivo. O último relatório (2020) Doing business, do Banco Mundial, coloca o Brasil em 184º lugar no ranking do indicador relacionado ao pagamento de impostos. O indicador mede não apenas o tamanho da carga tributária, mas também o custo administrativo envolvido no pagamento. Quanto pior a colocação no ranking, mais difícil fazer negócios. Foram analisados 190 países.

Além da malha tributária confusa, o Brasil tem hoje uma carga de impostos similar à de países da OCDE (os mais ricos), na casa de 34%, e acima de seus pares econômicos — na América Latina, a carga tributária média é de 22%. É nesse contexto em que a redução da complexidade tributária, por meio de uma reforma estrutural, poderia melhorar o ambiente de negócios e, assim, contribuir para o necessário aumento da produtividade.

Dados do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, mostram a evolução da produtividade por hora trabalhada dos principais setores da economia brasileira entre 1995 e 2021. Apenas a agropecuária mostrou avanço médio anual relevante da produtividade, de 5,6%. A indústria registrou uma queda média de 0,2% por ano, enquanto o setor de serviços, que concentra a maior participação na economia, apresentou expansão média de apenas 0,4% ao ano.

É nessa difícil emboscada que estão as contas públicas brasileiras. Fraco avanço na produtividade, arcabouço fiscal em xeque e baixa taxa de investimento, fatores que se traduzem numa perspectiva ruim para o crescimento sustentável da economia brasileira e, consequentemente, da arrecadação de impostos.

No curto prazo, a ajuda da inflação para impulsionar a arrecadação dos diferentes níveis de governo vem mascarando a real situação. O quadro geral é ruim, mas os números atuais são positivos. Nesse cenário, tentativas atabalhoadas de culpar os estados pelo aumento no preço dos combustíveis não levam em consideração que há anos as principais bases de incidência do ICMS vêm perdendo peso relativo na economia.

Além disso, a tendência do aumento da litigância quanto à essencialidade de produtos em que incidem o ICMS (como energia, telecomunicações e combustíveis), com o excesso de vinculação das receitas, cria uma tempestade perfeita para as contas estaduais num futuro próximo. Os desafios não são poucos, mas é preciso um debate técnico, transparente e comprometido para resolvê-los.

Fonte: O Globo

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