Campo Grande (MS) – A aprovação da Reforma Tributária é uma demanda antiga, que atravessa diferentes setores e traz a expectativa de redução de custos com pessoal e liberação de recursos para investimentos em produção.
Com a aprovação do texto que unifica cinco impostos sobre consumo, na madrugada de 7 de julho pela Câmara dos Deputados, as empresas contam com uma simplificação de procedimentos. Mas a PEC (proposta de emenda à Constituição) ainda precisa passar no Senado.
Um estudo de 2020 do Centro de Cidadania Fiscal —que tem o secretário do Ministério da Fazenda Bernard Appy como um dos fundadores— costuma ser mencionado pela equipe da Reforma Tributária para dimensionar impactos setoriais e macroeconômicos da medida.
O texto inclui simulações sobre a produtividade, como a redução de custos administrativos e do contencioso (disputas) tributário.
Em um cenário mais conservador (em que a produtividade do capital leve a uma alta de 12% do Produto Interno Bruto potencial, isto é, da capacidade de oferta da economia), uma reforma teria impactos positivos sobre o setor automobilístico (23,6%), de equipamentos eletrônicos e informática (21,6%) e de biocombustíveis (20,9%), entre outros.
De acordo com entidades setoriais e tributaristas ouvidos pela reportagem, a simplificação de tributos pode ter mesmo impacto nas empresas, que irão com o tempo reformular equipes e aumentar investimentos.
No entanto, como a previsão é de implantação gradual do novo sistema até 2033, essa economia não deve ser sentida agora.
Presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), Renato Correia avalia que o texto marca diretrizes, mas não dá condições, ainda, de calcular se as empresas devem rever processos e o número de funcionários dedicados à resolução de questões tributárias nas empresas do setor.
“Além de precisarmos aguardar a aprovação no Senado tem um segundo momento das leis complementares. Ou seja, ainda temos um grande caminho de legislação para colocarmos na ponta do lápis e vermos se vai reduzir ou não a mão de obra de cálculo dos impostos. A tendência é que se diminua, já que se fala em simplificação.”
Correia acrescenta que toda redução de custo em um processo empresarial permite maior margem para promover investimentos em áreas, como produção e tecnologia, ou na melhoria de processos e treinamentos.
A questão tributária é uma preocupação antiga para a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), com a confusão de impostos e seus desperdícios já tendo sido alvo de estudos do setor, informa.
A expectativa, diz a associação, é de um aumento de investimentos em pesquisas e desenvolvimento a partir dos recursos hoje gastos com adequação às regras tributárias.
Em 2019, um levantamento da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) feito com 827 empresas paulistas apontava a tributação com principal entrave à competitividade e ao crescimento (resposta dada por 83%). Em seguida, apareciam a burocracia (56,7%) e o acesso a crédito (39,2%).
De acordo com o estudo “Doing Business”, do Banco Mundial, as empresas brasileiras gastam para apurar, declarar e pagar impostos cerca de 1.501 horas por ano, em média. Nos países que compõem a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), são necessárias 159 horas.
Para o tributarista Breno Vasconcelos, da FGV (Fundação Getulio Vargas), após a substituição de ISS, ICMS, IPI e PIS/Cofins pelo IBS e a CBS, espera-se uma redução significativa das horas gastas pelas empresas para apurar e recolher tributos.
“Como IBS/CBS terão base ampla, as empresas deixarão de ter, por exemplo, a tarefa de classificação fiscal de bens e serviços, que hoje demanda horas consideráveis de trabalho. Também deve ser simplificada a lógica da não-cumulatividade, que hoje segue o modelo de créditos físicos, demandando análise das diversas restrições.”
Vasconcelos, que é sócio do escritório Mannrich e Vasconcelos e pesquisador do Insper, acrescenta que além das questões operacionais, deve contar positivamente o impacto da reforma no contencioso de tributos sobre o consumo.
Um estudo realizado por ele e outros colegas do Núcleo de Tributação do Insper, a partir dos processos tributários divulgados por 751 empresas abertas, identificou um contencioso de tributos sobre o consumo estimado em R$ 120 bilhões, que seria reduzido ou eliminado em ao menos 95% após a adoção do modelo de IVA (Imposto sobre Valor Agregado).
“Toda ideia de simplificação e de redução de custos é bem-vinda, mas vai levar tempo. A partir do ano que vem, e até em torno de 2026, a empresa ainda vai ter elevados custos para se adequar à nova realidade. Os novos impostos, IBS e CBS, vão conviver por um tempo com os tributos antigos e isso vai dar dor de cabeça”, diz Gustavo Fossati, professor da FGV Rio.
Mas tão logo as empresas consigam se adequar à essa nova realidade e conhecer a nova legislação, o trem vai estar nos trilhos, complementa. “Talvez em dois anos, sendo otimista, as empresas já estejam sabendo como lidar com essa nova legislação e comecem a começar a ver redução de custos.”
Ele diz acreditar que a contratação de profissionais da área —como especialistas em direito tributário e profissionais de contabilidade— pode até aumentar em um primeiro momento, até que as novas regras sejam compreendidas, e cair mais tarde, em alguns anos, após a transição.
“Já o contencioso só deve ser reduzido quando a gente tiver feito a implementação plena dos novos tributos. Durante o tempo de transição, até 2033, não sou muito otimista em relação às disputas.”
As 20 maiores empresas do país, em faturamento, foram procuradas pela reportagem, mas elas afirmaram que ainda é cedo para dar uma dimensão mais concreta de como a reforma poderá modificar suas equipes de profissionais e recursos utilizados para questões tributárias.
Também consultadas, outras entidades que representam diferentes setores alegaram que é preciso aguardar a aprovação do texto pelo Senado, bem como as leis complementares seguintes.
Fonte: FolhaPress